quarta-feira, 3 de setembro de 2008

O tempo passa, mas nem tudo muda

O hipocondríaco escreveu um post interessante sobre algumas coisas comuns aos adolescentes. Engraçado perceber que apesar do passar do tempo alguns costumes que tivemos, minha geração, continua viva nos dias atuais.

Eu, pessoalmente, dava um trabalho infernal para tomar banho. Olhando para trás percebo que não se tratava de escapar da água e do sabonete e sim ser muito bom em alguma coisa, mesmo que esta coisa fosse fugir do banho. Desculpa esfarrapada? Não. Eu tinha tanto trabalho para fingir meu banho que era bem mais prático e fácil simplesmente tomá-lo. Fingir o banho era como jogar xadrez com minha mãe. Era tentar prever como ela poderia checar a autenticidade do mesmo e, me adiantado a isso, sobrepujar suas capacidades dedutivas. Ela era Carl Hanratty e eu Frank Abagnale Jr.Começou de forma despretensiosa, claro. Eu ligava o chuveiro, sentava na privada lendo um gibi por 15 minutos e então saia. Funcionou por pouco tempo. O fedor de azedo entregou meu estratagema e ela passou a checar meu cabelo na saída. Fácil, pensei. Molho o cabelo. Desconfiada, e conhecendo sua cria, ela passou a intuir, pelo som da água, se eu estava mesmo sob o chuveiro. Mais cascudos. Fácil, uma capa de chuva. O som do plástico me entregou. Mais cascudos. Já sei, coloco apenas o pé sob o chuveiro. O fato do ruído ser constante me entregou. Mais cascudos. Agora sim, coloco e tiro o pé em intervalos irregulares. Funcionou por uns dois dias. Mais e mais cascudos.

A medida que as técnicas de detecção de minha mãe foram melhorando as minhas para fingir o banho também se aprimoraram. Ela esfregava os dedos na dobra do meu braço – o que invariavelmente fazia surgir um grude preto, eu passava a limpar apenas ali. Ela mudava para o sovaco, mais um lugar para lavar. Atrás do joelho? Orelhas? Eu passei a lavar apenas as dobras.
No fim das contas eu levava mais tempo e tinha mais trabalho para fingir o banho do que para realmente tomá-lo. Duvidam? Vejam só:

- Entrar no banheiro;
- Cobrir a fechadura do banheiro (para não facilitar as coisas para ela);
- Ligar o chuveiro;
- Lavar as dobras e atrás da orelha;
- Deixar cabelos no sabonete;
- Largar o sabonete no chão do banheiro;
- Tirar a tampa do shampoo e largar no chão do banheiro;
- Jogar fora um pouco do shampoo e do condicionador;
- Molhar o cabelo na pia;
- Enxugar a pia;
- Melar o dedo no sabonete e passar em pontos estratégicos (onde ela costuma cheirar);
- Salpicar shampoo no cabelo;
- Umedecer a toalha;
- Pisotear todo o chão do banheiro com os pés molhados;
- Salpicar as costas com água (um adolescente nunca enxuga as costas) e
- Deixar a toalha úmida largada sobe a cama.

Quando mamãe não percebia toda a encenação eu me sentia o tal. Isso só acabou quando ela me atingiu de forma baixa, utilizando o poder de mãe: ameaçou me dar banho, pessoalmente, todos os dias, dando atenção especial a minha “biloca” – palavras dela. Não, essa vergonha nunca! Já pensou se isso vaza? O mérito de ser um cascão não compensava esse risco. Eu capitulei. Entreguei os pontos. Precisava então descobrir outro lazer para a hora do banho. Descobri então a bronha.

Hoje pago meus pecados tendo que, constantemente, dar uns croques em Filipinho, que não finge tomar banho mas também não o toma de verdade. Passa horas sob o chuveiro, de porta aberta, balançando aquela pança para lá e para cá, ensaboando tudo menos a si mesmo. Ele ensaboa as paredes, os vidros do box, derrama shampoo no chão e desliza de um lado para o outro. Parece realmente uma beluga. Todo o lado ruim do processo (sabonete cabeludo no chão, shampoo aberto, banheiro molhado, toalha e roupas pelo chão) e um gordinho grudento são, quase em via de regra, o resultado dos banhos do pequeno meliante. O azar dele é que o pai não é mais padawan e sim mestre Jedi em evitar o chuveiro e nenhum truque dele cola comigo. A sorte dele é que eu não vou dar banho nele muito menos esfregar sua peia e retirar o polenguinho a força.

Como vêem os tempos mudam mas alguns hábitos continuam passando de geração a geração.

4 comentários:

Marcel disse...

tu era muito mais ninja do que eu.

Eden Wiedemann disse...

Eu SOU muito mais ninja que tu.

Kenia... disse...

E nenhum dos dois me viu chegando...

Eden Wiedemann disse...

Kenia é mais ninja que nos dois.